Mineração em alto-mar

Imensa riqueza, impactos profundos

Autor
Observatório Sistema Fiep - 03/05/2024

Além das disputas territoriais e marítimas, a geopolítica agora se estende para uma nova fronteira: o fundo do mar. Esse vasto ambiente aquático abriga uma biodiversidade rica, e grandes depósitos de recursos minerais.  Com a qualidade dos minerais terrestres em declínio devido à exploração excessiva, a busca por alternativas se volta para os recursos submarinos, essenciais para a transição energética em tecnologias como veículos elétricos, painéis solares, turbinas eólicas, baterias de armazenamento de energia, além de serem utilizados na fabricação de dispositivos como smartphones e armamentos militares.

Os países costeiros têm jurisdição e direitos exclusivos sobre os recursos do leito marinho dentro de sua zona econômica exclusiva (ZEE). No entanto, de acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS) de 1982, os recursos minerais em áreas do fundo do mar que não estão sob jurisdição de algum país, são considerados como pertencentes ao "patrimônio comum da humanidade". Sob os termos desta Convenção e do Acordo de 1994, a exploração comercial de minerais além das jurisdições nacionais, nas áreas internacionais do leito marinho (também conhecidas como "Áreas"), deve ser conduzida de acordo com as regras, regulamentos e procedimentos estabelecidas pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (International Seabed Authority - ISA). Assim sendo, é conferido a ela, autoridade para administrar a exploração e desenvolvimento dos recursos minerais, a investigação científica marinha e a proteção ambiental da parte internacional dos oceanos.

Em azul no mapa, as áreas sob autoridade da ISA (Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos) — Foto: Reprodução/ISA

Em azul no mapa, as áreas sob autoridade da ISA (Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos) — Foto: Reprodução/ISA

COMO FUNCIONA

A exploração da mineração em águas profundas teve início na década de 1960 e progrediu ao longo dos anos 1970. Contudo, devido a pesquisas realizadas, a atividade foi considerada desfavorável pela indústria mineradora na década de 1980. Recentemente, o interesse público e privado na exploração de minerais em alto-mar tem ressurgido, impulsionado pelo aumento da demanda por esses recursos e pela diminuição da disponibilidade de depósitos terrestres. Em todas as formas de mineração em alto-mar, o processamento do minério ocorre em terra, utilizando métodos convencionais, que são revistos periodicamente para que esse processo seja cada vez mais sustentável.

A mineração em águas profundas compreende três indústrias distintas, mas inter-relacionadas, delineadas pelos tipos de minerais alvo da exploração:

1.      Os sulfetos maciços do fundo do mar são formações pequenas e discretas geradas por fontes hidrotermais, com depósitos ricos em ouro, níquel, cobre e outros metais.

2.      As crostas de ferro-manganês ricas em cobalto se acumulam nas superfícies de montes submarinos, servindo como substrato para a vida marinha. Além de serem ricas em outros metais e elementos raros, essas crostas abrigam colônias de corais e esponjas, sustentando uma vasta cadeia alimentar e fornecendo habitats cruciais para peixes e outras espécies. A extração desses depósitos no fundo do mar envolve a trituração da estrutura onde se encontram os minerais, resultando na destruição do ecossistema que ali habita.

3.      os nódulos polimetálicos, também conhecidos como nódulos de manganês, estão dispersos pela planície abissal, uma vasta região plana do fundo do mar que cobre metade da superfície terrestre. Animais endêmicos, como esponjas, poliquetas e até corais, estabelecem-se e crescem entre esses nódulos, enquanto o sedimento abaixo e as águas ao redor abrigam uma variedade de vida semelhante ao resto da planície abissal, incluindo estrelas-do-mar, pepinos-do-mar e peixes. A mineração de nódulos polimetálicos é realizada por meio de um trator de esteira que percorre o leito marinho semelhante a um tanque, causando danos significativos à superfície do mar durante a coleta dos nódulos.

 

IMPACTOS DA MINERAÇÃO NO MAR 

Os impactos ambientais da mineração no mar profundo ainda são pouco compreendidos, além de complexos, variados e, dependendo do tipo de minério extraído, mas geralmente se enquadram nas cinco categorias a seguir:

1.      DESTRUIÇÃO DO ECOSSISTEMA IMEDIATO: A extração de minérios inevitavelmente resulta na morte da vida marinha associada a eles. Além disso, a remoção de estruturas complexas e a criação de trilhas de veículos e trincheiras alteram a estrutura e a topografia desses ecossistemas, afetando as correntes profundas essenciais para a dispersão e a migração de várias espécies.

2.      NUVENS DE SEDIMENTOS: A mineração em águas profundas gera nuvens de sedimentos na área explorada e na coluna de água circundante. Essas nuvens têm o potencial de sufocar os organismos próximos à zona explorada e podem viajar longas distâncias, afetando o clima, a pesca e as condições da água em outro lugar do mundo, porque todas as correntes são interligadas, além do distúrbio na diversidade ecológica.

3.      RUÍDO: A mineração em águas profundas é uma operação ruidosa. Veículos de coleta movem-se pelo fundo do mar, gerando luz, vibração e ruídos. Esse ruído pode ter impactos significativos sobre o comportamento e a saúde de mamíferos marinhos, interferindo na comunicação, alimentação, migração, desestabilizando os ecossistemas.

4.      TOXICIDADE: Os minérios contêm metais que, embora não sejam prejudiciais em seu estado natural, podem se tornar tóxicos durante o processo de extração mineral. Os nódulos polimetálicos, por exemplo, são altamente radioativos e podem contaminar os ecossistemas circundantes, impactando a cadeia alimentar por meio da bioacumulação.

5.      CONFLITO POR ESPAÇO: A mineração em águas profundas pode gerar conflitos por recursos. As áreas ricas em minerais muitas vezes funcionam como berçários e locais de agregação para espécies de peixes comercialmente importantes, colocando esse tipo de mineração em concorrência direta com a pesca comercial. Além disso, pode ocorrer sobreposição com cabos submarinos de telecomunicações e até conflitos culturais, como a ocorrência nos mesmos locais das rotas de viagem tradicionais

 

Em diferentes partes do mundo, a mineração em águas profundas já é uma realidade. No Alasca (EUA), ouro é extraído do mar por tratores, enquanto na África do Sul, mergulhadores enviam diamantes para a superfície através de dragas. A Namíbia segue o mesmo método, obtendo 64% de sua produção de diamantes do mar. Além disso, 25% da areia e cascalho produzidos pelo Reino Unido e quase um terço do carvão do Japão são provenientes do mar. Na França, o calcário marinho é produzido em larga escala. A China lidera na mineração de terras raras e possui grande potencial para explorar minerais no fundo do mar. Embora o Chile, Argentina e Bolívia detenham 65% das reservas mundiais de lítio, a China possui vantagens tecnológicas e econômicas para explorar minerais em águas internacionais. No Brasil, grande parte do petróleo é extraída de poços abertos na plataforma continental.

Um desafio enfrentado pelo Brasil é o fato de que apenas 1% de sua vasta plataforma continental foi mapeado, apesar de cobrir metade da área continental do país. Espera-se que até 2030, 25% desse território submarino esteja mapeado em uma escala topográfica que permita a extração comercial de minerais. O Serviço Geológico do Brasil - CPRM tem desempenhado um papel fundamental nesse esforço, trabalhando em parceria com a Marinha do Brasil e universidades para produzir informações geológicas, de caráter técnico, econômico e ambiental, necessárias para subsidiar a tomada de decisão por parte de empresas, públicas e privadas, e de órgãos governamentais brasileiros quanto a desenvolver atividades de exploração mineral e de gestão ambiental da Plataforma Continental Jurídica Brasileira e áreas adjacentes do Atlântico Sul e Equatorial. No entanto, o arcabouço legal brasileiro não diferencia entre mineração no mar e no continente, cabendo à Agência Nacional de Mineração (ANM) autorizar tais atividades. Os recursos minerais de interesse no Brasil incluem desde areia e cascalho para construção civil até sais de potássio e fosfato para uso como fertilizantes, além de calcário, ouro e diamantes.

 

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 Fontes:

Mineração em alto-mar

A disputa geopolítica pelas riquezas do fundo do oceano

Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cp30dr67p6jo

 

International SeaBed Authority – ISA

Disponível em: https://www.isa.org.jm/

 

Impactos diretos da mineração em alto-mar são a destruição do solo e da vida marinha

Disponível em: https://jornal.usp.br/atualidades/impactos-diretos-da-mineracao-em-alto-mar-sao-a-destruicao-do-solo-e-da-vida-marinha/#:~:text=H%C3%A1%20falta%20de%20estudos%20sobre,que%20perturbam%20a%20vida%20aqu%C3%A1tica

 

Mineração em águas profundas ameaça espécies e habitats do fundo do mar

Disponível em: https://www.ecycle.com.br/mineracao-em-aguas-profundas/#:~:text=Isso%20cria%20turbidez%20na%20%C3%A1gua,%2C%20baleias%2C%20tartarugas%20e%20tubar%C3%B5es.

 

Mineração no mar

Disponível em: https://brasil.oceana.org/mineracao/#:~:text=A%20minera%C3%A7%C3%A3o%20em%20%C3%A1guas%20profundas%20inclui%20tr%C3%AAs%20ind%C3%BAstrias%20distintas%2C%20mas,polimet%C3%A1licos%20encontrados%20em%20plan%C3%ADcies%20abissais

 

Recursos Minerais do Fundo do Mar

Disponível em: https://www.sgb.gov.br/publique/SGB-Divulga/Canal-Escola/Recursos-Minerais-do-Fundo-do-Mar-2560.html#:~:text=Outras%20subst%C3%A2ncias%20que%20v%C3%AAm%20sendo,sal%2Dgema%20(ES)

 

Mineração no fundo do mar: o que vem ocorrendo no mundo?

Disponível em: https://www.demarest.com.br/mineracao-no-fundo-do-mar-o-que-vem-ocorrendo-no-mundo/

 

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