Cidades de 15 minutos

Como o conceito pode inspirar mudanças no urbanismo brasileiro?

Autor
Observatório Sistema Fiep - 28/07/2025

Em um minuto:

  • Cidades de 15 minutos: o conceito propõe que as pessoas possam acessar, a pé ou de bicicleta, serviços essenciais como os relacionados a saúde, educação, trabalho, comércio e lazer em no máximo 15 minutos de onde moram.
  • Paris, Barcelona, Melbourne, Portland e Bogotá são exemplos que vêm implementando estratégias dentro do conceito de cidades de 15 minutos, como a criação de ruas exclusivas para pedestres, a expansão de ciclovias e o estabelecimento de zonas de uso misto.
  • A implementação do modelo pode estar sujeita a desafios em cidades como as do sul global, onde a urbanização foi marcada pela dependência do carro, fragmentação e desigualdade socioespacial.
  • O conceito deve ser visto como inspiração adaptável e não como receita universal. A sua implementação requer, entre outros fatores, investimentos públicos e participação cidadã no planejamento urbano.

O crescimento urbano acelerado, especialmente nas regiões metropolitanas, pode trazer alguns impactos à qualidade de vida nas cidades, como congestionamentos, poluição e desigualdade no acesso a serviços. Nesse contexto, ganha força uma proposta que inverte a lógica do planejamento centrado em grandes deslocamentos: as cidades de 15 minutos.

O conceito foi estabelecido em 2016 pelo pesquisador franco-colombiano Carlos Moreno e vem ganhando força desde então. A proposta das cidades de 15 minutos é garantir que as pessoas possam acessar, a pé ou de bicicleta, suas principais necessidades diárias, como aquelas relacionadas ao trabalho, educação, saúde, comércio, lazer e áreas verdes, em no máximo 15 minutos de onde moram.

Na prática, o conceito implica redesenhar as cidades com foco no uso misto do solo, no incentivo à mobilidade ativa e na distribuição mais equitativa de serviços nos bairros, em oposição à concentração nas regiões centrais. Entre os benefícios da implementação dessa estratégia estão os menores tempos gastos em deslocamentos, a redução do uso de automóveis e, consequentemente, da poluição atmosférica, a melhora da saúde física e mental, a redução das emissões de gases de efeito estufa e o fortalecimento do comércio local.

Paris é um dos exemplos mais emblemáticos dessa transformação. Desde 2016, sob a liderança da prefeita Anne Hidalgo, a capital francesa tem adotado medidas como a restrição de carros em centenas de ruas, a expansão da rede de ciclovias, que conta com 1.400 quilômetros, a construção de parques urbanos e a requalificação das margens do rio Sena. A meta é clara: devolver a cidade às pessoas.

Outras cidades também têm seguido caminhos semelhantes. Barcelona, na Espanha, vem implementando os "superquarteirões" sem carros, reduzindo o trânsito e abrindo espaços para convivência. Melbourne, na Austrália, tenta adotar o modelo de bairros de 20 minutos, com reforma no zoneamento e investimentos maciços no transporte público para reduzir a dependência de automóveis. Nos Estados Unidos, Portland foi pioneira na criação de bairros com serviços acessíveis em curta distância. Na cidade norte-americana, o tráfego de carros diminuiu 20% e o comércio local faturou US$ 1,3 bilhão a mais graças ao maior fluxo de pedestres. Na América Latina, cidades como Bogotá investem na ampliação das ciclovias e no transporte coletivo como pilares da urbanização mais integrada e centrada nas pessoas.

Contudo, o conceito de cidades de 15 minutos não está isento de críticas. Alguns urbanistas questionam sua viabilidade em cidades com elevada fragmentação, como é o caso das metrópoles do sul global. No Brasil, por exemplo, o histórico de urbanização baseada no automóvel criou cidades com vazios urbanos, dificultando a aplicação literal do modelo. A desigualdade socioespacial também impõe barreiras: enquanto bairros centrais concentram muitos serviços essenciais, as periferias frequentemente sofrem com a ausência de assistência médica, transporte de qualidade, segurança e acesso a áreas verdes.

Ainda assim, o conceito de cidades de 15 minutos não precisa ser interpretado como um modelo fechado e universal. Especialistas propõem sua adoção parcial como inspiração para a construção de cidades mais centradas nas necessidades das pessoas. A chave está em adaptar as ações à realidade local, com investimentos em infraestrutura, incentivos ao comércio local e à mobilidade ativa e melhor distribuição de escolas, unidades de saúde e espaços culturais pelos bairros.

O caso de Curitiba é ilustrativo da adoção de algumas estratégias relacionadas às cidades de 15 minutos. Reconhecida por seu histórico de planejamento urbano desde os anos 1970, a cidade apresenta bons índices de proximidade aos serviços essenciais: em média, 22 minutos a pé e 9 de bicicleta. A capital paranaense se destaca pelo sistema BRT (ônibus de trânsito rápido), que funciona há mais de 50 anos, e conta com 250 quilômetros de ciclovias.

Embora Curitiba adote práticas alinhadas ao conceito de cidade de 15 minutos, o mapa dos tempos médios de deslocamento a pé revela que o acesso a serviços ainda é desigual entre o centro e as regiões periféricas. Fonte: Plataforma 15min-City/Sony CSL

Um estudo realizado pelo Sony Computer Science Laboratories (Sony CSL) e publicado na revista Nature Cities mostrou que, mesmo em cidades que avançam rumo ao modelo de 15 minutos, a acessibilidade da população a serviços essenciais não é homogênea e as desigualdades persistem. Por isso, a discussão sobre cidades de 15 minutos precisa incluir aspectos socioeconômicos e culturais próprios de cada localidade, com medidas adaptadas à realidade local.

Além disso, o engajamento da população é essencial para a efetividade das estratégias associadas ao conceito de cidades de 15 minutos. O planejamento urbano precisa ser feito com participação cidadã e escuta ativa. Consultas públicas, como as realizadas em Paris para definir quais ruas se tornarão exclusivas para pedestres, são exemplos positivos.

Em síntese, o conceito de cidades de 15 minutos pode ser flexibilizado para garantir a melhoria da qualidade de vida urbana em diferentes contextos. Com adaptações sensíveis à realidade brasileira, a estratégia pode ser uma ferramenta para repensar o urbanismo no país, reduzir as emissões de carbono e tornar as cidades mais humanas e resilientes frente às mudanças climáticas.

 

Para mais conteúdo relacionado às mudanças climáticas, acesse o Painel de Indicadores de Mudanças Climáticas de Curitiba neste link.

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Para citar este artigo:

OBSERVATÓRIO SISTEMA FIEP / PAINEL DE INDICADORES DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE CURITIBA (PIMCC). Cidades de 15 minutos - Como o conceito pode inspirar mudanças no urbanismo brasileiro? Disponível em: https://paineldemudancasclimaticas.org.br/noticia/cidades-15-minutos. Acesso em: dd/mm/aaaa.

 

#MudançasClimáticas #ClimateChange #MobilidadeUrbana #PlanejamentoUrbano #CidadesCaminhaveis #MobilidadeAtiva #15minutecity

 

Fontes consultadas

AFP/ECOA UOL. Criador da 'cidade de 15 minutos' propõe menor dependência de carros. Disponível em: https://www.uol.com.br/ecoa/noticias/afp/2024/05/12/carlos-moreno-o-colombiano-criador-da-cidade-de-15-minutos.htm. Acesso em: 22 jul. 2025.

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