Biodiversidade Urbana

O Papel das Abelhas na Saúde e Sustentabilidade das Cidades

Autor
Observatório Sistema Fiep - 14/07/2025

Em um minuto:

  • As abelhas, assim como outros polinizadores, são essenciais para a biodiversidade urbana, garantindo a reprodução das plantas e contribuindo para o equilíbrio dos ecossistemas e para a produção de alimentos.
  • O Brasil abriga centenas de espécies de abelhas nativas, incluindo as sem ferrão (meliponíneos), como jataí e mandaçaia, que são inofensivas e responsáveis por polinizar até 90% das espécies arbóreas em alguns biomas.
  • As abelhas enfrentam ameaças nos centros urbanos, como a perda de habitats em função da ocupação desordenada, o uso de agroquímicos e a escassez de vegetação, fatores que já colocam várias espécies em risco de extinção.
  • Iniciativas como os programas Jardins de Mel (em Curitiba) e Poliniza Paraná buscam integrar as abelhas ao espaço urbano por meio da instalação de colmeias em praças, hortas, escolas e parques.
  • Todos podem ajudar: plantar flores, principalmente de espécies nativas, evitar pesticidas, apoiar a criação de abelhas e valorizar áreas verdes são atitudes que podem ser realizadas para tornar as cidades mais saudáveis e sustentáveis.

Quando pensamos em natureza, frequentemente imaginamos paisagens afastadas das cidades, como matas e florestas. Mas a biodiversidade também pulsa nos espaços urbanos, como nos parques, jardins, hortas comunitárias e canteiros. E é nesse cenário que as abelhas, especialmente as nativas, têm ganhado destaque como aliadas na construção de cidades mais verdes e saudáveis.

A presença de vegetação nas áreas urbanas contribui para o conforto térmico, a contenção de enchentes, a melhoria da qualidade do ar e a oferta de alimento. Mas para que as plantas cresçam e se reproduzam, elas dependem de um processo fundamental, a polinização.

A polinização é um serviço ecossistêmico que garante a formação de frutos e sementes e, consequentemente, permite a perpetuação das espécies vegetais. Somente em relação à comida, estima-se que 70% das plantas cultivadas para alimentação humana dependem, em algum grau, da ação de polinizadores. A polinização pode acontecer graças a agentes como o vento e a água ou por meio da ação de seres vivos. Nesse último caso, entram em cena os animais polinizadores, como morcegos, borboletas e, sobretudo, as abelhas.

Na natureza e no campo, o papel das abelhas é evidente: boa parte da produção das frutas e vegetais que consumimos, por exemplo, depende desses polinizadores. Mas nas cidades, onde vive mais da metade da população mundial, a função desses animais é menos reconhecida.

No ambiente urbano, as abelhas participam da produção de alimentos, favorecem o crescimento da vegetação, atuam na regeneração ecológica e ajudam a manter o equilíbrio dos ecossistemas locais. Sem esses animais, a biodiversidade das cidades pode ficar empobrecida, e os serviços ecossistêmicos a ela associados perdem a eficiência.

Quando se fala em abelhas, é comum pensar naquelas com ferrão, que produzem mel em colmeias estruturadas, como a Apis mellifera, resultante do cruzamento de espécies de origem europeia e africana. Porém, o país abriga uma das maiores diversidades de abelhas do mundo, com centenas de espécies nativas que evoluíram em harmonia com os ecossistemas brasileiros.

Essas abelhas nativas podem ser agrupadas, de forma geral, em duas categorias:

• Abelhas com ferrão, como as mamangavas (gênero Bombus). Embora tenham ferrão, não costumam ser agressivas.

• Abelhas sem ferrão, também chamadas de meliponíneos, como jataí, mandaçaia, uruçu e tiúba. São espécies sociais e inofensivas. No Brasil, há cerca de 250 espécies descritas. Essas abelhas são responsáveis pela polinização de 40% a 90% das espécies arbóreas e constroem seus ninhos em troncos, muros ou até no solo.

A criação racional dessas abelhas é conhecida como meliponicultura. Além de contribuir para a conservação das espécies, essa prática fortalece os serviços de polinização, inclusive em áreas urbanas. A meliponicultura também permite a produção de diferentes tipos de mel, cada um com características sensoriais únicas, que variam conforme a espécie de abelha e as flores visitadas.

 

Quais os desafios para as abelhas no ambiente urbano?

Apesar da sua importância para a manutenção da biodiversidade, as abelhas enfrentam uma série de ameaças nos ambientes urbanos.

A expansão desordenada das cidades, por exemplo, reduz a disponibilidade de áreas verdes, diminuindo a oferta de locais adequados para a construção de ninhos. Além disso, muitas cidades apostam no paisagismo com espécies exóticas ou com plantas que não produzem pólen. Dessa forma, sem abrigo nem alimento, essas polinizadoras podem sofrer a redução de suas populações.

Além da perda de habitats, outro fator crítico é o uso indiscriminado de agroquímicos em jardins, calçadas, praças e outras áreas urbanas. Mesmo em pequenas doses, os pesticidas podem afetar a saúde das abelhas, interferindo em seu sistema nervoso, desorientando seus voos e reduzindo sua capacidade de polinizar. Quando expostas de forma contínua a essas substâncias, muitas acabam não sobrevivendo.

As mudanças climáticas representam outro obstáculo importante para a sobrevivência desses animais. O aumento da frequência e da intensidade de eventos extremos, como ondas de calor, secas ou chuvas fortes, pode interferir nos ciclos naturais de floração e dificultar o voo das abelhas. Além disso, a alteração de temperaturas e padrões de chuva pode desregular o delicado sincronismo entre o período de floração das plantas e o momento de atividade das polinizadoras.

O efeito combinado de todos esses fatores já começa a ser observado. Em várias regiões do Brasil, cerca de 100 espécies de abelhas nativas sem ferrão estão sob risco de extinção. A redução das populações desses animais pode comprometer a biodiversidade local, além de afetar a qualidade de vida nas cidades. Contudo, apesar dos fatores críticos, várias ações podem ajudar a transformar os centros urbanos em espaços mais acolhedores para as abelhas.

 

Como tornar as cidades mais amigáveis para as abelhas?

Ações planejadas e colaborativas podem fortalecer as populações de abelhas e, com isso, ampliar os benefícios da sua presença nos centros urbanos.

Uma das estratégias para a proteção desses animais nas cidades é o incentivo à meliponicultura, ou seja, à criação de abelhas nativas sem ferrão. Essa prática tem crescido em diversas regiões do Brasil por ser segura e educativa. Além de valorizar espécies brasileiras, a meliponicultura contribui para a polinização da vegetação local e para a conservação da biodiversidade urbana.

Um exemplo notável nesse sentido é o programa Jardins de Mel, da Prefeitura de Curitiba. Desde 2017, a iniciativa instala colmeias em espaços públicos como praças, hortas, parques e escolas. Hoje, são mais de 300 colmeias abrigando espécies nativas sem ferrão do Paraná, como jataí, mandaçaia, mirim, guaraipo e manduri. Essas estruturas, presentes em locais estratégicos da capital paranaense, como o Jardim Botânico e o Parque Barigui, funcionam ainda como espaços de educação ambiental.

O programa Jardins de Mel é uma iniciativa pioneira da Prefeitura de Curitiba e hoje conta com mais de 300 colmeias de abelhas nativas sem ferrão instaladas na capital paranaense. IMAGEM: Hully Paiva/SECOM/ Prefeitura Municipal de Curitiba

Motivado pelo sucesso do programa curitibano, o governo estadual lançou, em 2022, o projeto Poliniza Paraná, com o objetivo de instalar colmeias de abelhas nativas sem ferrão em unidades de conservação e parques urbanos de diversos municípios paranaenses. Além de promover a conservação da biodiversidade, a iniciativa estimula a educação ambiental e fortalece a cadeia de meliponicultores no Estado.

O engajamento do poder público na proteção dos polinizadores é fundamental, mas não exclusivo. A sociedade e iniciativa privada também podem se envolver, apoiando a instalação de colmeias e o manejo de espaços verdes nos centros urbanos.

Ninho de abelhas jataí, localizado na Avenida do Batel, em frente ao prédio do Investment Center Itaú Personnalité, em Curitiba. IMAGEM: Elaine Latocheski

Para quem deseja cultivar abelhas sem ferrão em casa, o primeiro passo é buscar conhecimento. A criação de abelhas exige responsabilidade, capacitação e planejamento. Por outro lado, mesmo quem não pode criar abelhas pode contribuir de outras formas, começando pelo cuidado com o verde.

Plantar e cuidar de plantas e flores, especialmente as nativas de cada região, são ações efetivas para o cuidado com os polinizadores. Essas espécies fornecem alimento para as abelhas em diferentes épocas do ano. Nesse sentido, vasos, jardins, calçadas e hortas podem ser utilizados e se tornar refúgios alimentares importantes para esses animais.

Também é fundamental evitar ou minimizar o uso de agroquímicos. Produtos químicos aplicados em vasos ou canteiros podem intoxicar as abelhas e comprometer seu comportamento.

Investir em Educação Ambiental é outro pilar importante para a saúde das cidades. Hortas comunitárias, escolas, museus e outros espaços podem ajudar a formar uma cultura de valorização das abelhas e da biodiversidade urbana.

Além disso, cidades mais amigáveis às abelhas precisam ampliar a infraestrutura verde, com a instalação, entre outros, de telhados vegetados, jardins de chuva, áreas com vegetação nativa e espaços interconectados entre zonas naturais e ambientes urbanos. Áreas verdes urbanas com diversidade de espécies vegetais, como ervas, arbustos e árvores, oferecem alimento, abrigo e locais para a formação de ninhos.

Seja com colmeias instaladas por programas públicos, seja com flores plantadas em varandas ou canteiros, cada gesto conta. Tornar as cidades mais amigas das abelhas é um compromisso coletivo, além de um passo necessário para garantir a saúde, a segurança alimentar e equilíbrio ecológico nos centros urbanos.

 

Para mais conteúdo relacionado às mudanças climáticas, acesse o Painel de Indicadores de Mudanças Climáticas de Curitiba neste link.

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Para citar este artigo:

OBSERVATÓRIO SISTEMA FIEP / PAINEL DE INDICADORES DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE CURITIBA (PIMCC). Biodiversidade Urbana: O Papel das Abelhas na Saúde e Sustentabilidade das Cidades. Disponível em: https://paineldemudancasclimaticas.org.br/noticia/abelhas-biodiversidade-urbana. Acesso em: dd/mm/aaaa.

 

#MudançasClimáticas #ClimateChange #Abelhas #BiodiversidadeUrbana #Polinização #CidadesSustentáveis #Meliponicultura #AbelhasSemFerrão #JardinsDeMel #PolinizaParaná

 

Fontes consultadas

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS DAS ABELHAS. Abelhas sem ferrão. Disponível em: https://abelha.org.br/abelhas-sem-ferrao/. Acesso em: 8 jul. 2025.

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